ó heróis,
[mortos em overdoses?]
sonhais, nas nuvens
e nos profundos abismos…
vem a miragem!
e sobre vós cai o entardecer
mudo,
em magnificência
doirando tudo
[em vão!...
ah, da natureza este enlanguescer,
e este vago sofrer em demência,
não vos infligem comoção?
terror, tão grácil…
ah, fera ilusão!
mordido por desejos - 2020
em cada vigília
incandesce a alma!
a oração não rutila
na vida
bençãos e júbilos?
esquece o oásis,
o deserto,
o firmamento,
o sol,
as estrelas
e o vento…
virá o dia que uma mera tâmara,
degustada,
lhe revelará O segredo!...
fevereiro - 2015
dos insights,
o derradeiro passa,
mas há um paradoxo: revolve-se,
precipita-se,
mas a verossimilhança contígua
é a improbidade…
fatos, seres, acontecimentos: tudo, está presente,
mas não agrega notoriedade.
alegorias não merecem destaque;
ênfase, tardia, não reproduz
qualquer circunstancialidade!
a boca do homem [mal resolvida
continua aberta!...
o grito franco [arbitrário
auto-configurado em variantes
e toscas versões
não impera!
tento malograr personagens mal-acabadas
mas a fantasia [contraposta à realidade
me esfacela!...
gira menino, gira o balanço.
gira mundo, gira vida, gira-girando!
que não se perca - no tolo giro - o mais puro inocente encanto…
ontem - 1995
mente minha ---------- descentrada obra
excêntrica forma
paradoxo irresolúvel
mix de medos
patrimônio do pânico
---------- qual sua lógica [ particular?
mente minha ---------- realidade surpreendida
contexto transbordado
impertinente pulsão [ da vida
expressão e reabilitação de todos os medos
admissão de todos os medos [ mesmo sob pânico
---------- que trepidantes covardias devo evitar?
mente minha ---------- diálogo sempre monologado
óbvios neurônios de bits e bytes inapropriados
disrupção de medos [ cartoriais e mnemônicos
pânico-limite [ em constante confronto
---------- quem, senão eu, devo alertar?
suscetibilidade - 1980
ser o avanço com que recuas
avanço/ recuo/ avanço simultâneo...
recuar teus planos iluminados?
contraste de claro/escuro
rugas de expressão [consistentes
riso no rosto [completo abandono
intensa mulher [de contrastes
radiosa/ luminosa/ imponente…
ser o teu ímpeto [inventado
a pressão de teus dedos sobre a pele
avanço/ recuo/ avanço simultâneo
almas conjecturadas nas alturas
vida plena com tua vida [diferenciando e ritmando cores
lógica linear [te sinto assim!
aprofundado prazer [reforça o gesto?
impacto visual [ó anjo profano
minha ânsia te exige, esquiva forma [furtiva…
te esvais em carícias brutais!...
minha ânsia te exige, volúpia entregue ao claustro…
avanços e recuos, intensos, sensuais!...
nenúfares - 1998
tentei legitimar o segredo
as velhas casas sumiam no horizonte
multiplicando minha curiosidade intensa
tentei legitimar o segredo
encontrei, entretanto, silêncios poéticos
a praça era apenas
murmúrio de arvoredos e esvoaçantes folhas
!... lânguida água caía nas lodosas bacias de pedra
tentei, ah como tentei, legitimar o segredo
se eu transitar entre casinhas pobres
se estremecimentozinhos de apreensão revirar meu ser
eu clamo ao carteiro: jamais
desista ante cancelas emperradas
ou fuja de empertigados cães
ah, carteiro,
as cartas que você entrega
naquela porta empenada
fazem olhos brilhar, calados, embaraçados, impudicamente exaltados
ah, carteiro,
se eu mesmo pudesse entregar palavras tão melífluas
talvez eu retinisse meus cascos de fauno
nos ensolarados lajedos da rua
espalhando multicoloridas flores ao vento [aloucado!
belas janelas - 1992
somos um, dois, três,
tantas vezes mil
metade, um terço, um quarto,
fímbrias em azul anil
somos tudo, nada, cheios, vazios,
algoritmo d'um torpe ardil
vida, morte, ira, gula, cobiça, hóstia,
preciso tiro de fuzil
somos a população
que restou no bas fond?
o cancro
que degenera Gaia?
somos a doce letargia e a suave vadiagem
que locupletam os amantes?
ah, ainda somos o inominável: alguém/
/ na cara dura
bebendo água mineral / no bar do Jorge
/ nos traiu!
normatividade - 2019
cá, metade minha
és tu
lá, metade tua
sou eu
cá e lá,
ser uno somos nós!
silêncios de alaridos nos consubstanciam
corpos e almas nos pacificam
esposa,
amante,
irmã…
esposo,
amante,
irmão…
o universo nos contêm: descarrilamentos
em curso
[ Afrodite,
impassível?!?!...
pragmático - 2019
amigo do peito
amigo do bem
amigo da hora
amigo [ estranho sedutor…
nada, nada mesmo, vai nos separar!
amigo, porto seguro e clausura
amigo, catapulta e sombra fresca
amigo, mente e coração [ sem qualquer censura…
amigo, caminho sem volta [ saga única
vilipêndio consentido
alma tênue [ exigida ao extremo
tènue resgate [ luz sagrada!
amigo, lágrimas e alegria
do seu lado, sem você
até logo, nunca mais
fúria extrema, exaltada calmaria
me salva, te salvo
me traia, te traio
me ama, te amo
me odeia, te odeio
alma gêmea, alimento no prato & mordida na mão
megalomania de um em dois [ diabólica
anjo meu, vilão teu, grude e ausência nossa [ imortal!
te levar daqui - 2010
a mão
desorientada e maníaca
escreve simplórios versos
arrancados à força
d’uma medíocre vida [ encenada!...
o roçagar da pena
no papel imaculado
dá conformidade à poesia
[ mais confessada.
palavras [ singelas
partejam formas miraculosas
de toda singularidade [ devassadas…
volúpias, olhares vítreos, silêncios sublimes,
dores ocultas, solidão rigorosa,
felicidades (in)alcançadas, circunstâncias malditas,
nada [ nada mesmo
desaponta a alma [ atormentada!...
a mão [ covarde
de dedos trêmulos escreve…
a pena [ febril
não pede licença!...
não é que o apêndice - maldito - do misantropo,
quer caligrafar pirotecnias?
gineceu - 2013
se quebrou.
algo se quebrou
em seu íntimo.
se quebrou, se quebrou,
algo, sutil, ínfimo?
se quebrou, quebrou…
deixando-se levar pela maré,
consumindo-se lentamente ao sol,
emudecido ante o próprio espírito
[ ensandecido!
se quebrou nos recifes…
se quebrou nas salinidades…
se quebrou no vôo das gaivotas e dos albatrozes…
se quebrou em mastros de mágicas caravelas
e miraculosos sextantes
em ultramar...
se quebrou
ante o olhar
da mais sedutora sereia
[ sem titubear!...
algas marinhas - 11.03.2015
condenado a saber/
pela experiência amarga/
insidioso ofício de tornear tormentos/
o que as palavras querem dizer/
e o que elas [ atoleimadasindomáveiscaixaspretas
jamais dizem?
condenado a censurar zilhões de palavras/
temeroso que apenas uma palavra [ insuspeita
inserida no lugar de outra palavra [ também insuspeita
ou a mesma palavra [ desafetada
enovelada no carretel d’uma frase [ concatenada
possa trair meu pensa(senti)mento/
me delatando a existência/
revelando minha identidade/
/ tabulando minha história
/ mal contada?
condenado a reinar sobre reinos silenciosos/
silenciando ecos de palavras com falso pudor/
exagerando impossibilidades de amar, rir, sonhar, recordar, conviver e,
como simples mortal,
acolher a morte?
à bordo d’uma garrafa de bom rum, navego fascinação
contemplação
sedução
paixão… emoção!...
"estou" escritor?!?!...
inverno - 1978
Dele se tenha evocado o nome santo/
vórtice eletrizado de puros e diáfanos sentimentos/
anelos e algoritmos compondo sacros pensamentos/
visão de nuvens, anjos, flechas de luz [ cândido encanto…
Dele se tenham as vitórias rejubiladas/
mentes, corpos e almas libertadas/
sofrimentos, mazelas e penúrias aliviadas
[ pomba da paz em eterno vôo sagrado…
Dele se tenha a certeza do poder envolvente/
do Pastor que promete e não mente/
da Ovelha que se imola e não sente…
Dele se tenham os humores aspergidos/
louvores, mirra e incenso ao Pai oferecidos
[ total remissão de criaturas indolentes!…
DMAE - 15.12.2001
aziagos favores rejeita, ó Naná!...
beberica tépido café
enrola, novamente, a metamórfica linha no retrós
e, axé, agradece a todos os orixás!...
mede suas horas [ de plácida babá
adota fúrias [ de mamãe jacaré
protege todas as crianças
durante as balbúrdias, após, além, até…
risca e fere o dedo negro
no liso corte das luminosas fotos
do lustroso álbum de família
cuida da casa, solicita pajens, afaga Tertúlia [ a gata
observa relógios de parede, aniquila pêndulos, reprojeta o tempo…
Iemanjá - poderosa - tudo pode,
e chutar pudicos traseiros burgueses se faz mister!...
Naná, simultânea [ anárquica e máquina.
Naná, santa negra [ mãe, empregada e matriarca.
Naná, incansável [ exótica, nordestina e piegas.
Naná, serviçal [ chaleira, prateleira, cozinheira, torneira, cafeteira, passadeira,
enceradeira, lavadeira, parideira e curandeira.
Naná, aço inox, seda pura, súbita felicidade, rainha dos congados,
soluço sufocado no peito,
lágrimas - jamais admitidas - nos olhos,
anjo especial [ em doce degredo!...
Naná, das saudades... simplesmente, "mamãe" Naná!...
romanos - 1979
