sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

" inestético "



poema de estrofes métricas

           palavras que cantam  -  e voam

                          disposição visual de versos  -  lúdicos





as alvas formas brancas  -  e claras

                                           os ecos estrugidos no céu

   o lamento das quedas d'água

      a ausência de alguém na imensidão

          a rosa tumultuada em espinhos

            a caneta ainda movimento

               o papel ainda ritmo

                  a mão ainda voz

               a voz ainda mente

            a mente inda coração

         o coração inda poesia

      a poesia inda brusco salto

   a rima inda morte iminente

o poema?... inda sem solução!





rua Rodrigues da Cunha - 11.09.1990 


quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

" olholho "

 

o olho mede.

           mede olho: contrasta a dimensão imaginada

                              com as arestas obscuras da realidade!

o olho imagina.

           imagina olho: desoculta geometrias impossíveis

                                  esboçadas em sonhos disformes!




o olho mede: o mundo se inventaria

                      por tudo o que está desconjuntado?

o olho imagina: a geometria se evidencia

                          por tudo o que está irrealizado?

o olho mede. o olho imagina. olho e abstração geométrica

                                               se fundem nos confrontos vazios,

                                               nas longas insônias eivadas de multicoloridos comprimidos,

                                               na epifania das frases mecânicas [ que vão e vem!...




o olho mede… 

           a medida, degradada, tem alguma coisa

           que poderia ter sido [ e foi não.

o olho imagina…

           as partes são sempre maiores que o todo;

           todos os (alti)planos são infinitos [ por extensão.




o olho se olha [ como uma adolescente 

                                           [ perplexa 

                                           [ que se engravida!...




janeiro - 1983


terça-feira, 27 de dezembro de 2022

" pedra de quinas 17 "




no railways no railways no railways no railways                              

no railways no railways no railways no railways

no railways

no railways

no railways no railways

no railways no railways

no railways

no railways

no railways no railways no railways no railways

no railways no railways no railways no railways




no railways no railways                   no railways

no railways   no railways                 no railways

no railways     no railways               no railways

no railways       no railways             no railways

no railways         no railways           no railways

no railways           no railways         no railways

no railways             no railways       no railways

no railways               no railways     no railways

no railways                 no railways   no railways

no railways                   no railways no railways




no railways no railways no railways no ra

no railways no railways no railways no railw

no railways                                     no railways

no railways                                         no railways

no railways                                           no railways

no railways                                          no railways

no railways                                        no railways

no railways                                      no railways

no railways no railways no railways no railw

no railways no railways no railways no ra




 novembro - 1994


segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

" arcanjo "



arcanjo/ que se faz onírico/

hialino - ao encontro do arrebol/

nascido entre estrelas e o azul celeste/

florindo e perfumando como cianomos divinos/

esplêndido como silente luz

emanada d’um magnífico sol…




se manifesta coisa diáfana/

branda emoção castiça/

pólen, ouro e flama/

rima, delicadeza, vigor/

sangue, turbilhão, éter/

quimera, pesadelo, misteriosa cabala/

misticismo doído, sublimação, pavor…




seduz Marias

            e copula

            com as nuvens: nem mesmo o Tempo

                                                           é seu Senhor!...




 surdina - 2006

 

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

" inconcepto 0 "



   tudo que se faça abandono/

                           declínio, degredo e queda/

             jasmins cortados a golpes bizarros/

                          liberdades desinventadas/

                              euforias boquiabertas/

                              recolhimentos desautorizados...




                                tudo que se faça brinquedo/

                 coisas, reflexos e palavras apátridas/

      mistério, humor e excitamentos da vagina/

força, dor e efeitos ultrajantes da talidomida/

monótonas mensagens - inúteis

                                      abandonadas na secretária eletrônica...




tudo que se faça solidão única: monólogos por dentro; 

monólogos por fora;

confissões sobre nada; 

furor - amenizando a vida [ chapada!




melancolia - 1998

" guerra civil "

 

     doce garota minha

que destino lhe reserva a vida

     escrito em sânscrito

                  em aramaico

                 e em caracteres cuneiformes

nos alongamentos das trompas [ absurdas

circunvagando a auréola do seu ovário?

supérfluas railways esquadrinham a imensidão  

células cancerosas me detonam a razão

lutas inglórias devastam a população

órfãos letárgicos esqueceram a letra da canção

drogas espúrias deturpam qualquer sensação

sexo virtual/ covarde/ não admite penetração

                                   mas a doce garota é minha adoração!...




e lhe beijo e lhe abraço e lhe afago

e lhe  mimo e lhe compro [ e me vendo

e lhe enclausuro e lhe liberto [ e me mato

e lhe filio e lhe desfilio [ e me adoto

e lhe procuro e lhe encontro [ e me esqueço

e lhe sabatino e lhe semeio [ e me violento

                                              e a civilização/ despreparada/ lhe destrói!...




doce garota minha

que não era a supremacia do meu esperma

que não era a divindade d’um óvulo [ abortado

que não era lúcido zigoto [ por partenogênese originado

que não foi sonho puro [ na realidade vingado

que não foi castidade de bordel [ inocência intocada

que não foi mais uma alma perdida [ na Geena deteriorada...




doce garota… minnnnnnnnnnha?




degeneração - 1995


segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

" pedra de quinas 18 "

 

sou como eu mesmo sou não

Nosferatu das inesperadas madrugadas

encerrado em totêmicas torres de pedra

a equilibrar elementos freudianos que/

inocentemente/ complementam toda cena




sou como um cão andaluz - sem dono

pedras anônimas pisadas no cais

tapuia, celta, grego e filho-da-puta

podridão dos cemitérios - beleza e asco

prestigioso ante a vulgaridade dos prostíbulos - sensuais




sou como meditação profunda - incubando ideias

pátrias aniquiladas pelos toscos capitais

padecimentos remidos/magnificados em gritos

vastidões medidas em efêmeras métricas - abissais




sou metáforas espantadas pelas malogradas vitórias

!... contratempos fugidios

! alucinações demais




 dezembro - 1995


sábado, 17 de dezembro de 2022

" Z12 "



e exila e escorre e emigra: freme as narinas, sua ordinária/

e transgride e traslada e tresnoita: o cancioneiro é maldito;

o concílio desagrega/

e priva e nega e separa: a vida é puta-merda/




do corpanzil a bocarra destoa:

seminu o examinador apregoa:

há euforia no bordel/

dos espelhos refletem-se obstáculos:

na tergiversação dialogam-se conflitos:

há êxodo, eclipse e prólogo/




e muda de cara e revira a boca

e se perde na cama/ insone dama

e me bate na cara... seu nome, seu nome era?...

e grita meu título (de honra?...) e joga baralho e se delonga nos drinks/

seu nome... quem você era?...

nem Nara, nem Gabriela, nem Tereza,

nem Judith, nem Helena, nem traste seu nome era!...




e me chama de padreco e me morde a orelha

e me arranha as costas

e me recebe dentre as roliças pernas...

m e    e n c e r r a     n o     i n f e r n o !

um anjo, um anjo apocalíptico: isso é o que você era!...




expertise - 1981

 

quinta-feira, 15 de dezembro de 2022

" news 12 "



romanceio sem romance.

                 o protagonismo é frágil.

a solidão é bem mais certa.

                  semelho a todos...

quem me assemelha?




e lá fico,

na impessoalidade das trevas,

nada tendo com a vida,

evadindo-me dela.




e lá fico, 

aniquilado por uma loucura coletiva,

emocionado com o nonsense da sociedade,

embebedando-me nela.




minha revolta não é passional...

mas não existo

sem ela!




 blog’s news - 2018

 

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

" pedra de quinas 4 "

 

passatempo

    louco demais para ser gerado

fruto da vida regenerado

tempo degenerado

asa trôpega

asa inclinada

   em roda

   à roda - zerada




    passatempo

perseguido na sua gênese - despedaçado

    sonho já sem voo - imobilizado

anacronismo conformado

coisa distorcida

perímetro circunvagado

    em rota

    na borda - extravasada




    passatempo

terão vivido em vão tantos poetas

sem legar um só efêmero segundo

ao tempo já eternizado?...




 dois filhos - 1981


segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

" mecanismo "



até o nada

               [ que vulgata é ]

análise imanente de dogmas

liturgia e deslinde dos acontecimentos mesquinhos

               milagre do movimento sincrônico das horas...




até o nada

               [ alomorfia de metáforas ]

revivificação de matizes silentes

resíduos de leitura trash

               imperenes imagens estereotipadas...




                      até o nada...

            outros mesmos enigmas...

esfinge, nauseabunda,

              depressiva, pálida!...




rua Janaúba - 19.01.2010

 

sexta-feira, 2 de dezembro de 2022

" sanduíche de gente "


e David se impressionou 

com o modo como a luz percorria sua pele, seu cabelo castanho, 

à medida que ela entrava e saía da sombra, e da luminosidade,

e com a natureza fluida de tudo o que ela fazia.

naquele ambiente de aço, concreto e vidro fosco

os dois seguiam pela vida pensando só neles dois,

ponto e contraponto, 

um impossível no deslumbramento da outra, 

outra sempre puxando a mão do um,

misto-mais-que quente [sanduíche de gente.




haviam começado o romance

em momentos em que ela achara 

que o rugir do silêncio em seu coração a deixaria louca, 

em que o universo misterioso de uma outra presença, qualquer presença, 

lhe pareceria um alívio.

haviam começado o romance

em momentos em que ele achara

que a idéia de perda pairava nos jogos de morder e assoprar,

em que as memórias repletas de anseios, saudades antecipadas,

lhe pareceriam lascívia. 


 


ele e Valdirene eram um caso sério

álcool metilado, lanolina e raspas de cogumelo

ao som d’um bolero

dose dupla [ românticos sujeitos à inconveniência de sua miséria

amor extravagante

(des)compromisso inteligente [ sanduíche de gente




rua Eduardo Marquez - 2021


quarta-feira, 30 de novembro de 2022

" fragment 97 "


ó heróis, 

[mortos em overdoses?]

sonhais, nas nuvens

e nos profundos abismos…

vem a miragem!




e sobre vós cai o entardecer

mudo, 

em magnificência

doirando tudo

[em vão!...




ah, da natureza este enlanguescer,

e este vago sofrer em demência,

não vos infligem comoção?

terror, tão grácil…

ah, fera ilusão!




mordido por desejos - 2020