quarta-feira, 1 de novembro de 2023

" cárcere "


no escuro do porão da nossa casa viviam irriqüietas almas

ora em êxtase [ voando pela eternidade

ora embaladas em sonhos [ criando melífluas fantasias…

um belo dia um’alma me segredou

como surfar a luz

passar cabresto em pirilampos e estrelas

rodopiar ileso na densa escuridão

fazer pactos c’o Diabo

e evocar o amor [ sem sucumbir à inocência…  




o problema é que eu só tinha 8 anos.

minha mãe só se importava c’o terço de prata.

meu pai só se importava c’os rabos de saia.

Nenzoca só lavava, passava, cozinhava, varria, polia, 

sonhava, fazia figas e praguejava. 

os muleques só se importam em bodoquear sanhaços no brejo.

as mulecas só se importam em boquetear os muleques. 




o problema é que no escuro do porão 

se fazia meu cárcere.

lá eu mantinha “com fervor”: mertiolate e arnica

para os machucados do corpo…

                                                papel e lápis para os machucados d’alma…

                                               uma verve rebelde de poeta 

                                                                  [ para enfrentar o quebranto!  




nem me lembre - 1987


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